terça-feira, 26 de maio de 2009

OSCULUM OBSCENUM























num perfeito meia nove
me pressiona contra o ventre
como louca ela se move
até que a língua entre.

ela geme, urra, chora
e encara a minha vara,
que bom seria se agora
ela peidasse em minha cara.


Artur Farrapo

segunda-feira, 18 de maio de 2009

FULCRO



















Minha vontade: um desgaste
sem fulcro
Estou a fenecer,
estou sentado no pátio
deste império natimorto.

Perdi meu nome
no cancro espalhado
dos teus olhos. Agora sou
um lazarento infeccionado
pela lepra da tua boca.

Estou de partida, sim, estou
de partida.
Na partida me esbarro no
caroço de pus prestes a estourar
no teu pútrido.

Já não me escondo nas faces
que tenho. Sou quando estou
numa delas.

Ao me ver com a face
fria e pálida, lembres
que sou somente mais um.

Alguém passará por meu
cadáver e comentará
até o que não fui.


Vagner Castro

sábado, 2 de maio de 2009

SIRROSE VII - O Retorno!























Prometida desde 2007, a sétima edição da Sirrose finalmente está nas ruas! Homenageando Aleister Crowley (homenagem sugerida e realizada por Edilson Seta, também autor da belíssima capa), os sirróticos realmente tiveram de vencer uma "urucubaca" para que esta edição saísse. Atrasos, mudanças de planos, brigas internas, traições, e até ossos quebrados fizeram parte do processo desta edição que, felizmente, está pronta e à disposição dos leitores amantes da literatura. Além da bela e merecida homenagem ao amigo compositor Elon Veleiro, a Sirrose VII traz como novidade textos de jovens escritores de São Paulo (Bárbara Leite e Flávio Mello) e tem como projeto estender sua publicação para além da região norte. Os leitores de Belém e São Paulo apreciaram muito a revista, como já aconteceu em outras ocasiões, em que a Sirrose chegou até o nordeste. Novos contatos também foram feitos em Manaus, o que significa que novos talentos surgirão nas páginas da revista, em breve. E para você que quer uma pequena amostra do que vem nesta edição (e também para exorcizar todos os obstáculos que surgiram ao longo de seu trabalho de publicação) aprecie um pouco da poesia de Bárbara Leite:


COM FIANÇA DE FÉ

É preciso acreditar nas ciganas,
no jogo dos búzios,
na borra do café,
no pai de santo,
nos rituais do candomblé.

Contenta também umbanda,
ou se preferir, no padre,
no bispo, no pastor,
nas imagens,
na puta que pariu!
um menino desnutrido...

É extremamente necessário acreditar
no desconhecido sorriso
que deseja bom dia,
na esmola que veio demais
e também na desconfiança
que a caridade nos traz.

Acredite nos brancos
e nos pretos,
amarelos e vermelhos
e nos seus corações
que podem ser bons
e também o contrário.

Acredite na intuição,
no poder da oração
e da palavra.

Acredite no tudo,
na dor do luto!
Assim evita-se
a crença no nada.

Seja o seu maior entusiasta
e creia no que achar que deve
exceto na descrença.

Não devemos esquecer,
pois seria desavença:
a puta pariu um menino desnutrido
que também precisar crer.

Obs: Para os interessados, de Manaus e de fora, a revista está sendo vendida a 10 reais. Abraços sirróticos!

segunda-feira, 2 de março de 2009

Breve resenha sobre o livro SINDICATO DOS INVÁLIDOS























A prosa contida na obra Sindicato dos Inválidos, pela editora Sirrose, é seca-surda, mas ela está aí, poeticamente costurando o jogo dos desgraçados, apesar do estilo aristocrático de viver das figuras destacadas na história.
A obra é detentora de uma linguagem inovadora que chega até provocar no leitor desavisado certa estranheza. Flor, Paixão, Bodó, Barriga, Tonho, Piriquito. Zé Pezão, D. Gregaria, dentre outros, são as figuras que compõem o quadro absurdamente realista e marginal ambientado num plasma de miséria lírica que é o espaço presente. O autor mergulha embebedando-se no imaginário popular: "Quem trabalha não tem tempo pra ganhar dinheiro", diz Bodó, que foi expulso de casa porque matou a mãe.
A vida séria dos normais é brincada na roda viva de bate-papos, gargalhadas, onde morre um nasce outro, e assim, a existência é levada empurrada pela barriga:
A calçada onde Bodó está deitado é sindicato de inválidos
pisado pelos pés descalços dentro do sapato. Um resto de
olhar escapa das pálpebras se fechando, tentando se abrir
no sonho.
Marcus Ney - Sindicato dos Inválidos.

Márcio Santana - Manaus, 12.10.2008

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

DIABO NO CORPO


















Estava na casa do vizinho,
o ciúme dominou meu padrasto.
Ele queimou minha biblioteca
restos de cinza foi o que vi.
Vi as algemas
quando os homens da lei o conduziram.
Dias depois, estava novamente bêbado
_o rosto vermelho, inchado.

Eu estava na casa de uns amigos,
ele adentrou a casa, tentou por força
me tirar daquele lugar.
Meus ossos estalavam de tensão.
Os homens da família em questão,
não tiveram forças para detê-lo.

Lembro-me da última vez que o vi.
Foi numa festa animada
na quadra de uma escola pública.
As pessoas que o conheciam
gritaram,
pois ele estava a caminho.

Houve tumulto e briga.

Ele feriu uma moça.
Cortou a barriga dela de baixo pra cima
Os órgãos ficaram expostos e ela gritava muito.
O sangue espirrava sem parar.

Fizeram o mesmo com ele.
Quando ele me viu, sorriu.
Um sorriso maldoso.
Acariciou o intestino delgado e deu o último suspiro.
Até hoje as pessoas comentam
tudo isso que aconteceu.
E explicam que naquele dia,
ele estava com o Diabo no corpo.



Nira Martins.

sábado, 21 de fevereiro de 2009























-Deus existe?
-Eu acho.
-Então, tu acha que ela volta?
-Ela tá na Bahia, otário.
-Pois é... eu sou uma besta que sempre me iludo.
-E o que Deus tem haver com isso?
-É que o crente lá da igreja disse que pra Deus nada é impossível.
-E esse Deus tem dinheiro pra ti pegar um barco? Pra Bahia fica mais caro pra ir de mar!... Tá foda! Apaga a luz e dorme!
-Porra tu é insensí­vel pra caralho, né, viado!
-A mulher tá resolvida, pô! Tem o sustento dela. Tem o cacete que quiser chupar. Tu acha que ela vai se preocupar com um escritorzinho de merda? Vamos ter consciência não?
-Que negócio é esse de merda?
-Tá bom, tá bom! Tu és um clássico undergraund. Tá mais leve assim?
-Teu teatro qualquer um faz. Só faz papel de bebum e bicha.
-Pelo menos não sofro de frescura. Posso ser bicha mas não sofro por bofe.
A luz já acessa, a porrada canta. Os vizinhos acham que é briga de viados. Mas, são apenas dois artistas lisos e solitários.



Diego Morais. Ilustração: cena do Inferno da Divina Comédia de Dante, por William-Adolphe Bouguereau.