terça-feira, 26 de maio de 2009

OSCULUM OBSCENUM























num perfeito meia nove
me pressiona contra o ventre
como louca ela se move
até que a língua entre.

ela geme, urra, chora
e encara a minha vara,
que bom seria se agora
ela peidasse em minha cara.


Artur Farrapo

segunda-feira, 18 de maio de 2009

FULCRO



















Minha vontade: um desgaste
sem fulcro
Estou a fenecer,
estou sentado no pátio
deste império natimorto.

Perdi meu nome
no cancro espalhado
dos teus olhos. Agora sou
um lazarento infeccionado
pela lepra da tua boca.

Estou de partida, sim, estou
de partida.
Na partida me esbarro no
caroço de pus prestes a estourar
no teu pútrido.

Já não me escondo nas faces
que tenho. Sou quando estou
numa delas.

Ao me ver com a face
fria e pálida, lembres
que sou somente mais um.

Alguém passará por meu
cadáver e comentará
até o que não fui.


Vagner Castro

sábado, 2 de maio de 2009

SIRROSE VII - O Retorno!























Prometida desde 2007, a sétima edição da Sirrose finalmente está nas ruas! Homenageando Aleister Crowley (homenagem sugerida e realizada por Edilson Seta, também autor da belíssima capa), os sirróticos realmente tiveram de vencer uma "urucubaca" para que esta edição saísse. Atrasos, mudanças de planos, brigas internas, traições, e até ossos quebrados fizeram parte do processo desta edição que, felizmente, está pronta e à disposição dos leitores amantes da literatura. Além da bela e merecida homenagem ao amigo compositor Elon Veleiro, a Sirrose VII traz como novidade textos de jovens escritores de São Paulo (Bárbara Leite e Flávio Mello) e tem como projeto estender sua publicação para além da região norte. Os leitores de Belém e São Paulo apreciaram muito a revista, como já aconteceu em outras ocasiões, em que a Sirrose chegou até o nordeste. Novos contatos também foram feitos em Manaus, o que significa que novos talentos surgirão nas páginas da revista, em breve. E para você que quer uma pequena amostra do que vem nesta edição (e também para exorcizar todos os obstáculos que surgiram ao longo de seu trabalho de publicação) aprecie um pouco da poesia de Bárbara Leite:


COM FIANÇA DE FÉ

É preciso acreditar nas ciganas,
no jogo dos búzios,
na borra do café,
no pai de santo,
nos rituais do candomblé.

Contenta também umbanda,
ou se preferir, no padre,
no bispo, no pastor,
nas imagens,
na puta que pariu!
um menino desnutrido...

É extremamente necessário acreditar
no desconhecido sorriso
que deseja bom dia,
na esmola que veio demais
e também na desconfiança
que a caridade nos traz.

Acredite nos brancos
e nos pretos,
amarelos e vermelhos
e nos seus corações
que podem ser bons
e também o contrário.

Acredite na intuição,
no poder da oração
e da palavra.

Acredite no tudo,
na dor do luto!
Assim evita-se
a crença no nada.

Seja o seu maior entusiasta
e creia no que achar que deve
exceto na descrença.

Não devemos esquecer,
pois seria desavença:
a puta pariu um menino desnutrido
que também precisar crer.

Obs: Para os interessados, de Manaus e de fora, a revista está sendo vendida a 10 reais. Abraços sirróticos!

segunda-feira, 2 de março de 2009

Breve resenha sobre o livro SINDICATO DOS INVÁLIDOS























A prosa contida na obra Sindicato dos Inválidos, pela editora Sirrose, é seca-surda, mas ela está aí, poeticamente costurando o jogo dos desgraçados, apesar do estilo aristocrático de viver das figuras destacadas na história.
A obra é detentora de uma linguagem inovadora que chega até provocar no leitor desavisado certa estranheza. Flor, Paixão, Bodó, Barriga, Tonho, Piriquito. Zé Pezão, D. Gregaria, dentre outros, são as figuras que compõem o quadro absurdamente realista e marginal ambientado num plasma de miséria lírica que é o espaço presente. O autor mergulha embebedando-se no imaginário popular: "Quem trabalha não tem tempo pra ganhar dinheiro", diz Bodó, que foi expulso de casa porque matou a mãe.
A vida séria dos normais é brincada na roda viva de bate-papos, gargalhadas, onde morre um nasce outro, e assim, a existência é levada empurrada pela barriga:
A calçada onde Bodó está deitado é sindicato de inválidos
pisado pelos pés descalços dentro do sapato. Um resto de
olhar escapa das pálpebras se fechando, tentando se abrir
no sonho.
Marcus Ney - Sindicato dos Inválidos.

Márcio Santana - Manaus, 12.10.2008

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

DIABO NO CORPO


















Estava na casa do vizinho,
o ciúme dominou meu padrasto.
Ele queimou minha biblioteca
restos de cinza foi o que vi.
Vi as algemas
quando os homens da lei o conduziram.
Dias depois, estava novamente bêbado
_o rosto vermelho, inchado.

Eu estava na casa de uns amigos,
ele adentrou a casa, tentou por força
me tirar daquele lugar.
Meus ossos estalavam de tensão.
Os homens da família em questão,
não tiveram forças para detê-lo.

Lembro-me da última vez que o vi.
Foi numa festa animada
na quadra de uma escola pública.
As pessoas que o conheciam
gritaram,
pois ele estava a caminho.

Houve tumulto e briga.

Ele feriu uma moça.
Cortou a barriga dela de baixo pra cima
Os órgãos ficaram expostos e ela gritava muito.
O sangue espirrava sem parar.

Fizeram o mesmo com ele.
Quando ele me viu, sorriu.
Um sorriso maldoso.
Acariciou o intestino delgado e deu o último suspiro.
Até hoje as pessoas comentam
tudo isso que aconteceu.
E explicam que naquele dia,
ele estava com o Diabo no corpo.



Nira Martins.

sábado, 21 de fevereiro de 2009























-Deus existe?
-Eu acho.
-Então, tu acha que ela volta?
-Ela tá na Bahia, otário.
-Pois é... eu sou uma besta que sempre me iludo.
-E o que Deus tem haver com isso?
-É que o crente lá da igreja disse que pra Deus nada é impossível.
-E esse Deus tem dinheiro pra ti pegar um barco? Pra Bahia fica mais caro pra ir de mar!... Tá foda! Apaga a luz e dorme!
-Porra tu é insensí­vel pra caralho, né, viado!
-A mulher tá resolvida, pô! Tem o sustento dela. Tem o cacete que quiser chupar. Tu acha que ela vai se preocupar com um escritorzinho de merda? Vamos ter consciência não?
-Que negócio é esse de merda?
-Tá bom, tá bom! Tu és um clássico undergraund. Tá mais leve assim?
-Teu teatro qualquer um faz. Só faz papel de bebum e bicha.
-Pelo menos não sofro de frescura. Posso ser bicha mas não sofro por bofe.
A luz já acessa, a porrada canta. Os vizinhos acham que é briga de viados. Mas, são apenas dois artistas lisos e solitários.



Diego Morais. Ilustração: cena do Inferno da Divina Comédia de Dante, por William-Adolphe Bouguereau.

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

WORK IN PROGRESS























um cai mundo dentro de mim
buraco luminoso cai mundo
e tudo dentro de mim.
rastro de vácuo atrás dos passos
largos com que ando lado para outro
do quarto mundo dentro de mim
dentro dele, clausura.
caixacofres dentro entro cofrecaixas
como a boca que tenho na boca
e ainda assim as grades brancas
são os calcários dentes de Deus.
cai mundo: umbigodeus.
e na minha barriga o céu abrigado
(cosmicoito interrompido);
cai mundo e eu no quarto
de olhos serrados.



Daniela Moraes. Ilustração: Mae West - Salvador Dali.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

BLUE TUESDAY























As velhas cores que cercam
admitem agora outra forma.
E a luz que meus olhos fitam
metamorfozeia-se em natureza morta.

Vistas extraordinárias!
Panoramas mentais
em árvores bicentenárias
e seus caules de idéias más.

As novas cores cores diferem
da básica justificativa existencial.
A razão de as interferirem
metamorfozeia-se na busca original.

Amores um tanto difuzos e fáceis
bebem-se entre o suor anestesiado.
Odores surpreendentemente táteis
copulam alucinações em raro estágio.

Em êxtases de ansiedade contínua.
Querer sentir-se: será essa a única razão?
O pós-orgasmo da resposta anfetamínica
metamorfozeia-se na crença que não.



Suzy Freitas. Ilustração: cartaz do filme More, de Barbet Schroeder (1969) _que também é a capa do disco de trilha sonoro do filme, gravado pelo Pink Floyd.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

PÃO E CIRCO





















E viva o riso de quem os tem
como as lágrimas
de quem a s derrama com saudades.

Que vivam os miseráveis
com seus buchos cheios,
com suas almas vazias
e com seus filhos nos hospícios.

E viva o amor
_o abstrato sentimento que mata,
o abstrato substantivo tão, tão dito
e tão pouco vivdo.

Que vivam os amantes e os amigos
com suas ilusões tão pouco ardentes
e que morram os poetas,
os irresponsáveis poetas,
parceiros das dúvidas e dos desamores.



José Canuto.

domingo, 15 de fevereiro de 2009

TEMPLÓRIO












Passa, passa tempo o desespero,
o ódio, a mágoa, a desgraça,
enfim toda essa malevolência em mim
que rogo, rogo e nunca passa.
Já perdi minha sforças de guerreiro.

Passa, passa tempo o meu sufoco,
traga-me ar, ó santa hemoglobina
tua benevolência não combina
com esse cancerígeno caroço.

que corrói-me sob o grito poderoso
dos status dos antigos hemisférios
e me leva sob canto glorioso
aos sepulcros, cavernosos cemitérios.

Não! Não!
Quero acordar deste horror!
Passa, passa tempo, por favor!...
Essa necrofagia não aguento não.

Maldito galardão
de altares ermos,
insólitos, soberbos
de uma cavernosa podridão.


Rojefferson Morais. Ilustração: Gaulês Moribundo - atribuído à Epígono de Pérgamo, século III a.C.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

NO VINHO ESTÁ A VERDADE























O vinho é um
reverencioso
desvanecedor da timidez.
Precioso alvoroço de festim!
O vinho é hilariante
e circula em nossos corpos
provocando uma dança,
fazendo o pensamento bailar!
O vinho decreta
que a dança seja permitida
e que a descompostura
do bailariço seja
a travessura da elegância.
A dança se reúne
com as gargalhadas explícitas
da em briaguez.
Inclinação indispensável
para cantarolas de poemas
românticos
e músicas estonteantes.
Belíssimo rosto mantém
os olhos arraigados
em minha boca
e o sorriso deflagrando
felicidade total.
Fico curioso, mas prefiro rir!
Risos compulsivos
e sem cerimônia!



Edilson Seta. Ilustração: Jovem Baco - Caravaggio.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

LANÇAMENTO DE "O HOMEM COM A ABERTURA NA TESTA" (2008)
























































1. Márcio Santana exibindo um exemplar de sua novela, O Homem Com A Abertura Na Testa. 2. Márcio falando no lançamento do livro. 3. Tenório Telles (da Valer) em seu discurso de abertura do lançamento de O Homem Com A Abertura Na Testa. 4. Eu (Marcelo Farias) em minha vez de falar. 5. Pollyanna Furtado declamando um de seus lindos poemas. 6. Wagner também abrilhantando a ocasião com seu lirismo. 7. Rojefferson mostrando seu talento efervescente ao fechar a sessão de declamações. 8. Márcio, Virgílio e Pollyanna (de costas). 9. Márcio, sua mãe, o poeta Thiago de Mello e Pollyanna Furtado. 10. Márcio e seu cachimbo (2007).

domingo, 8 de fevereiro de 2009

SIRROSE - MOMENTOS





























1. Capa da Sirrose VI - 2. Palestra sobre a Sirrose, em 2007, na UFAM - 3. Adriano Furtado explanando sobre a Sirrose _sua história e sua importância para a literatura no Amazonas _ ladeado por Márcio Santana e Max Caracol - 4. Pollyanna Furtado, Márcio Santana e Edilson Seta vendendo a Sirrose VI em teia literária (2006) - 5. Márcio Santana tentando explicar a Teoria do Caos (Marcos Ney em primeiro plano - 2006) - Débora Carla, Virgílio, Adriano Furtado e Márcio Santana no Bar do Cabeludo (2006) - Jalna Gordiano, Márcio Santana, eu (Marcelo Farias), Débora Carla e Inácio (ex-namorado da Jalna), 2007.

sábado, 7 de fevereiro de 2009

PSICOLOGIA DAS CORES


















As ruas - pintadas de negro.
Meus olhos - pintados de branco.
Branco meus olhos negros
nessa rua de branco.

Todo branco, vermelho,
mais que negro, duplicado
dois aziagos negros:
um vermelho e um manchado.

Fossem seus cabelos negros
brancos, como ainda são;
num futuro hei de vê-los
brancos de um negro vão.

Todo azul, se vermelho,
é um azul mais maduro.
Como o céu que é vermelho,
já sem futuro algum.

Todo espelho é mais velho
que seu dono - absurdo
é não ver que o espelho´
é duplo em tudo.

Já meu peito é mais velho
que sua jaula no mundo
o tempo de pensamento
é claro-escuro.



Adriano Furtado. Ilustração: vitral - foto de Gilson Camargo.

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009























Meu corpo,
esta imunda porção
de células natimortas
se autodecompõe ao pesar
dos anos insanos que passam
regados desregradamente
entre mesas, álcool, copos
e putas que flagelam
minha alma errante de ser.
Meus tecidos epiteliais
desfibrilam-se em soturnos bacanais.
Meu hipotálamo mudou-se há tempos
para o lado mais obscuro da vida.
Meus olhos macambúzios
debaixo dessas pálpebras ébrias
teimam em desvirtuar o horizonte.
Minhas pernas me levam sempre
ao bar mais próximo da morte.
Meus sonhos são recheados
de covas de terra fria
procurando aplacar
a embriaguez em que me encontro.
As vozes que ouço são murmúrios
e lamentos satânicos dos que
diuturnamente me acompanham
nessa empreitada sem volta
que a cada amanhecer se renova.



Amarildo Maciel. Ilustração: Boris Karloff como o monstro de Frankenstein.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

CRIADORA DE SÍMBOLOS






















Não sei definir o que há,
nem consigo segurar o que sinto
Expressão de forma cabalística
Mil formas de pensamentos "sem sentidos".
É porque é bom.
Adoro brincar de Deus!
Mas crio coisas "inúteis"
sufocando os meus instintos.
Indefinindo, confundindo os olhares.
De vulgo luxurioso
vocabulário reprimido.
Comunicação bloqueada,
numa tênue reflexão,
de tanto buscar o clímax...
Afasta-se,
nefasta
e nada.
Pois se contenta com burburinhos;
de honrarias fáceis.
Destruindo o verdadeiro
templo da salvação
de uma criadora de símbolos.



Pollyanna Furtado. Ilustração: Leda Atômica - Salvador Dali.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

VOMITANDO TINTA NO PAPEL
















Judas
foi o apóstolo que mais amei.
Foi Judas quem me pariu.
Nasci de uma caixa de música
triste
como a dançarina que pula da caixa
de Pandora
dançando e fingindo nada importar,
embalando o sonho de uma criança
qualquer,
abrindo e fechando,
repetindo a música chorada,
repetindo a dor guardada
e sentida solitariamente.
Quando a corda quebrar
e a bailarina parar
o silêncio tomará o rumo do nada.
Que um dia bíblico transforme em
paz
o que existe.
Trombetas soarão,
vermes viverão solenemente.
Que o juízo seja eterno,
que todo o mal feito
transforme o choro em sorrisos
sinceros.
Espero arduamente
a corda quebrar.



Jalna Gordiano

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

EPÍTETO DO EPITÁFIO
















meu nome escrito à mijo
escorre como choro
salgado como um soro
a terra que há de me comer
agora me bebe
e eu tô cagando pra isso.

pobre Farrapo, precisou morrer
pra alimentar a erva
e só então descobrir
que é um adubozinho de merda.



Farrapo

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

EXPRESSO DOS ANJOS

















Andar ruas, esconder-se multidão. Pessoas escondem-se em mim. Sou minhas doenças. Fumaça. O mundo é este nevoeiro de carbono lançado no cosmo por máquinas velhas. Placas, cartazes, sapatos, passadas, passados. Pele descartável. Hoje as flores de plástico tem pétalas de carne. Misturo-me com a pele dos outros. Mal me quer, bem me quer. Despetálo-me neste ônibus ao meio dia. Essa carcaça de ferro e vidro exibe o rosto dos esquecidos na janela. Os postes me acompanham.
A máquina leva seus passageiros nas costas. Pingos de chuva vêm do céu da boca das nuvens. Mexo o braço mexendo os corpos dos estranhos. Como poderei amá-los? Esqueço seus rostos num olhar desinteressado. Esqueço. Não me vejo. Meus pés confundem-se com os passos falsos, sem graça e inúteis dos outros. O ônibus, essa nave sem vôo, é a verdade de seus passageiros. Minto sem saber. Sei que eles mentem em busca de uma verdade imaginada nos botões caídos sobre o metal da nave. O chão não é visto, nem sentido. É preciso chegar no ponto. Chego na estação. O mundo é cheio de paradas. Saberemos sempre onde descer. Aonde chegar? Em casa? Na fábrica? No bar? Na praça? Na morte?
As lâmpadas piscam para se apagarem. Cortes. Portas. Janelas. O ônibus segue lotado. Estou lotado dos outros com meus ombros enrijecidos. A cigarra canta pra morrer. Quando precisarei descer? A cigarra canta pra morrer. Medos de sinetas imperativas. Estou de pé nos pés dos outros. Me conforto vendo sete passageiros sentados. Das costas de suas costas surgem pontas de ossos em vão brotando em forma de galhos venosos. Asas vão cada vez mais crescendo. A penumbra. Pares de asas. Enormes asas. o ônibus não poderá suportá-los, nem comportá-los, muito menos me assombrar. Vejo mães parirem seus filhos para comê-los. s passageiros se incomodam com a penugem dos alados. Apesar das longas asas, eles não conseguem se mexer. O homem de asas levanta-se. Outros ocupam seu lugar. Alívio para os pés cansados. O expresso tem janelas grandes, de vidro. Todas fechadas. As portas automáticas não abrem fora do ponto. Eles precisam sair do veículo e voarem. Pra quê ter asas se não podem voar? Apesar de imensas janelas cristalizadas de plástico preto, a ventania não circula. O dia inteiro será sempre noite de dentro dessas máquinas. Eu quero que este monstro de aço esmaltado se choque no primeiro muro da moral. Que se espedaçe no último desastre. Que se espalhem seus vitrais pelo mundo.
Um menino arranca da sacola um martelo. Quebra as janelas e solta as aves. Os alados escapam damáquina. Voam libertos sobre a cidade suja.


Marcus Ney. Ilustração: Lagarde Perpignan - Salvador Dali.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

JORGE TEIXEIRA, JOÃO PAULO, VAI?!...


















Somos feitos de solidão e porra!
Ele só tinha grana pra uma cerveja equeria foder uma boceta também. Quebrou ali a Frei José dos Inocentes e descendo devagar a velha Mauá. Entrou no primeiro inferninho que viu e foi sentar-se na mesa dos fundos, no escurinho. Pediu a cerveja. Haviam duas tvs, uma de putaria e outra só de porrada e ele se ligou na de putaria, bem na cena em que um negão enterrava fundo o seu pau enorme no cu tesudo da putona branca. Se tivesse grana agora pagaria uma puta igualzinha aquela. Abriu a braguilha e puxou o pau pra fora, dando início à masturbação. Há anos que não tem uma foda decente. O mesmo buraco escroto da mulher. Depois dos quarenta parece que tudo seca. Qualquer dia desses, a enteada ia levar a dela. Ia pensando em coisas estranhas enquanto punhetava-se. A puta branca do filme agora chupava loucamente o pau imenso do negão e ele se admirava com a cena, de como ela engolia tudo aquilo e ainda conseguia sorrir. Ah, hoje mesmo daria cabo da mulher e descabaçaria a enteada de oito. Amasturbando o pau com mais rapidez, parecendo querer arrancá-lo de seu corpo. Não chegou a gozar não. Um infeliz qualquer vendo aquilo soprou pro Cabeça de Bigorna, que foi até ele tomar providências:
_Não pode isso aqui, não! Paga a cerveja e cai fora!
Guardou o pau melado de volta, pagou a cerveja e deixou o bar. Na porta ainda parou e pensou: "Tudo pela metade, cerveja, punheta, a vida..." Olhou a rua. "Aonde ir agora?" Pensou no Paulista, que sempre lhe fiava uma dose. No caminho, uma puta velha e gorda lhe chamou para o banho.
_Só se for de graça _respondeu _Tô duro! Amanhã te pago!
_Vai te foder, seu fudido! Quero que teu pau caia, seu fudido de merda! _rebateu a puta.
"Porra! Fudido de merda! Enfiasse logo um espetinho de gato no peito!" Entrou irado no bar do Paulista e suplicou uma dose.:
_Porra, Paulista, só uma dose, velho!
_Tu nunca tem grana, porra! Assim tu me quebra, caralho! _retrucou o paulista.
Papai Noel sorriu do seu canto. Foi quem pagou a dose e disse:
_Volta lá e resolve a parada.
Tomou a maldita de uma golada só e seu rosto todo tremeu. deixou o bar e fez o caminho de volta. Apanhou um espeto sujo do chão e se aproximou da puta velha, que distraída pintava os lábios com batom. deu duas estocadas consideradas em seu rabo gordo e flácido e ela soltou um urro de bicho e começou a gritar, mas ninguém veio em seu socorro. Ele então subiu, na boa, para descansar na Praça do Pau Mole e por um instante olhou um céu vomitado e pensou: "Fudido é a mãe!" Quando chegasse em casa ferraria mesmo de vez com a patroa e arrancaria o cabacinho da enteada de oito, que graças a Deus, nunca o chamou de pai. Perto dali, o boca de ferro passava gritando:
_Jorge Teixeira, João Paulo, vai?!




Márcio Santana - Crimidéia.

sábado, 31 de janeiro de 2009

TODA CENSURA SERÁ CENSURADA




















Outubro
Escrever é crime
A juventude ousa
Pensar é crime

Outubro
Colégio Brasileiro Pedro Silvestre
A literatura ocupa
Os espaços ócios
Desmonta a preguiça mental
Destrói as jaulas de aula

Nos corredores da morte
No lugar dessas certezas
Espalham-se papoulas
O néctar das rosas
Atraem os alados
Foragidos de suas colméias
As crianças são libélulas livres
A escolástica do tormento
Vira um jardim
Perfumado de poemas
Abrem-se os portões!

Outubro
Ameaça!
Os burocratas caem
Dos destroços
Erguem-se
Fecham-se as portas!
“Prendam o poeta! Matem o poeta!
Espanquem o poeta!”
Levados pela polícia
Trancados na cela
São torturados em câmaras de gás

Primeiro Distrito Policial
Ditadura risos & aplausos
O poeta está vivo
“O que não mata fortalece”

Das grades sai o canto
Apesar desses brutos
O poeta vivecanta!
Uma bomba explode na praça!

(poema em repúdio á prisão dos escritores no dia 29 de outubro de 2003)
OS EDITORES DA REVISTA SIRROSE. Ilustração: propaganda do Xarope São João.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

A CORROSIVA AÇÃO DA SIRROSE...























Desde o ilustre, porém já aposentado Clube da Madrugada (1954 - até os dias de hoje _apenas simbolicamente...), Manaus não via surgir um movimento artístico/literário. Porém, a boemia de décadas, desde que a literatura marginal se tornou uma febre entre os jovens escritores de todo o mundo, a partir dos anos 60, finalmente conseguiu produzir um movimento de fato nas plagas amazônicas.
Tudo começa ainda em 1994, quando Márcio Santana, José Canuto e Janer José se reunem para pensar uma nova forma de abordagem literária numa Manaus então prá lá de estagnada. Muitas idéias e nenhuma realização duradoura marcou este período, até o novo século e novo milênio surgirem no horizonte. Em 2001, Márcio Santana convida Marcos Ney para tentarem uma revista. A proposta fica pendurada, dando tempo para Marcos Ney ainda tentar o suicídio por questões amorosas. Sua tentativa de dar fim à própria vida tomando produtos de limpeza, felizmente, não dá certo e em 2003 a idéia da revista toma corpo.
O nome Sirrose é adotado para deixar claro o caráter marginal, boêmio e corrosivo da revista. Propositalmente, a palavra é grafada com S, para passar a idéia de "escrita de bêbado". O primeiro exemplar é impresso (de forma semi-ilegal, como é até hoje), reunindo vários escritores de bar, de todas as idades (a maioria jovens entre 20 e 35 anos).
Após o porre de batismo da primeira edição, Márcio, Marcos, Bocão, Diego Morais, Wagner e mais um ou dois outros membros da revista resolvem divulgá-la em um colégio. Era de manhã e todos estavam de ressaca (tinha virado a madrugada). Entraram no Colégio Brasileiro e propcuraram pela direção. Ninguém havia chegado, nem mesmo muitos professores. O colégio estava entregue à bagunça dos alunos. Os sirróticos entram em uma sala de aula e começam sua divulgação, declamando poemas e empolgando os estudantes desocupados.
Quando já estavam na segunda sala de aula, a coordenadora chega e vai verificar do que se trata aquela inesperada manifestação. Eles explicam seu interesse em divulgar sua literatura e ela, em princípio, lhes concede a devida permição. Em agradecimento, Bocão abraça-lhe e dá-lhe um beijo no rosto. Pra quê?...
Tão logo o diretor chega, ele já solta os cachorros sobre os sirróticos, acusando sua literatura de pornográfica e chamando a polícia. Marcos Ney se empolga em fazer um discurso, inflamando os ânimos dos estudantes que só queriam um pé para ver o circo pegar fogo. Finalmente a polícia chega e todos vão para a DP. Lá, são fichados sob a acusação de incitar baderna em uma instituição de ensino e vender literatura pornográfica à menores. Para completar, a coordenadora acusa Bocão por assediá-la sexualmente, beijando-a no "pescoço" (pode?!)... Os sirróticos passam um dia na cela, aguentando humilhações e "visitas" inesperadas. Primeiro, são obrigados a ficar só de cueca na cela (o único a ficar de calça é Marcos Ney, pois não usava cueca). Depois, recebem a ilustre visita da delegada, que aparece abraçada à sua "gata" e faz aquela pressão básica. Por fim, um militar aparece perguntando: "_Quem foi o palhaço que deu um chupão no pescoço da mamãe?!" Uma vez liberados, saem já com julgamento marcado. São condenados, mas recebem penas alternativas (Márcio Santana, por exemplo, teve de distribuir três cestas básicas). Todas as revistas apreendidas com a pequena trupe de escritores são incineradas pela polícia, numa atitude digna do Santo Ofício.
Porém, este foi apenas o batismo de fogo (literal!) do movimento. Em 2004, durante a Semana de Filosofia da Universidade do Amazonas, Márcio, Marcos e mais um amigo de outro estado (cujo o nome me escapa à memória) pedem para entrar na palestra de um professor convidado e fazer uma "intervenção poética" (declamar de surpresa, coisa que eles já faziam nos bares). o professor responsável não os permite e como protesto os sirróticos ficam nus no haw da universidade. A eles também se junta o poeta, quadrinhista e também sirrótico Adriano Furtado, que fica igualmente nu. Desta vez os sirróticos escapam da cela, pois amigos da universidade intervém e contornam a situação.
E assim, de lá para cá o movimento cresceu, arrebanhou novos e excelentes aderentes e já ganha a atenção, ainda que cautelosa, da imprensa regional e de instituições divulgadoras da cultura em Manaus, como a TV UFAM e a livaria Valer.



MARCELO FARIAS

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

MANIFESTO SIRRÓTICO


















Estamos cansados de cagarmos na mesma privada! Levantemo-nos, desejosos que a SIRROSE seja pública escapando das bulas doentias! O tédio está ordenado no andar desses fracos! Vejam o olhar deles! É tão repetitivo. Estamos sedentos de andarilhos alados que voem no som harmonioso da poesia. Não suportamos mais estes enlatados que apenas engordam em seus acordos excessivos. Queremos a acidez da palavra, que não corta apenas o peito, mais o coração em corpoativo. Fora com os consumistas! Vomitamos o fel que bebemos, pois este mundo só nos serve para nos causar náuseas. Voemos como as abelhas operárias e nos embriaguemos do néctar das flores na ânsia de serem devoradas. Como zangões, libertemo-nos destas colméias e espalhemos pelas ruas todo o mel para nos banharmos do sabor vivo das papoulas. Hoje, os carros não cruzarão as avenidas, pois que iremos nos deitar no asfalto quente e treparmos coletivamente. E os filhos que nascerem deste dia serão libélulas livres para criar. Felizes são os desajustados porque escapam, nossas armas serão as nossas palavras, o beijo, a saliva cáustica, o pus da ultima ferida. Os, livros não mais serão o morfo-suporte das bibliotecas, mas sim, a nossa e a tua vida girando no mundo que gira na gente. A partir de hoje, o poeta, o artista, o pensante, não ficarão mais amordaçados, mas viverão o arroto espumante espalhado na sopa fria pronta para ser bebida. Bebamos, pois, este cálice de fluídos. Entreguemos o nosso fígado de vez aos deuses hepáticos.
Sejamos uma SIRROSE destruidora desses espaços fixos para criarmos novos mundos e nos embriagarmos da alegria de existirmos!!


OS EDITORES DA REVISTA SIRROSE. Ilustração: Adriano Furtado em ação (com Marcos Ney, sentado, ao lado).